Não sou Leleco nem em sonho


Tenho uma característica que não sei se é boa ou ruim. Me julguem, podem julgar, é pra isso que estamos aqui. É que, como gosto de escrever sobre assuntos cotidianos, alguns acabam pendendo para o campo particular da vida. Quando vejo, estou revelando pormenores íntimos da minha curta jornada, assuntos que não se fala abertamente num almoço com a família da noiva, ou em reuniões de negócios.
Ora, vejam só, em oito anos já me revelei pichador de muros (AQUI), caloteiro (AQUI), contei inúmeras experiências amorosas da infância (AQUI um exemplo) e agora no livro vocês contemplarão também minha pequena passagem pelo mundo do crime, é o assunto de uma das crônicas inéditas. Se é o que me gera assunto, urge que seja publicado. Não posso ter pudores se a inspiração me faz refém de minhas próprias peripécias.
Essa semana, por exemplo, quebrei um copo. Grande áfrica, quem nunca fez isso na vida? É o que você pensará. Mas, calma, o troço foi meio bizarro. Peguei o copo normalmente, coloquei metade de água, a outra metade de suco. O suco é forte e gosto de diluir na água pra amenizar o gosto. Tá, eu admito que também é pra render mais. A Dani ri da minha cara e me chama de sovina, o que é uma injustiça absurda. Na real ela fala pão-duro, mas acho o termo "sovina" mais chique.
Bueno, fui pegar o copo pra tomar meu preparado todo pimpão, levei-o até a boca e tomei um susto. O fundo do copo ficou na pia, ocasionando um lambuzo dos mais crespos por todo o chão da cozinha. Sim, a cozinha é pequena. Eram duas da manhã. E eu estava nu. Olhem aí o teor íntimo da conversa. Gente, mas eu durmo nu, nesse calorão é o único remédio! Considerem que minha camada de pelos equivale a uma calça de lã e um pulôver, daqueles tricotados carinhosamente pelas avós, e teremos um panorama nada favorável ao meu sono nas noites de verão. Ou seja, se visto uma cuequinha sequer, contribuo para mais alguns litros de transpiração. Portanto, sim, eu estava pelado, nu e com a mão no bolso.
Limpei toda aquela meleca, né. Imagino que a cena não deva ter sido a mais agradável do mundo. Mulher nenhuma gostaria de ver um homem pelado passando pano no chão da cozinha durante a madrugada, não nas minhas condições. A menos que fosse o Reinaldo Gianecchini, ou o Domingos Montagner, que agora a mulherada tá chegada num velhote. Entretanto, não sou nenhum dos dois e ainda tenho todos os pelos do Tony Ramos, o que tecnicamente não me torna um fetiche dos mais atraentes.

E foi isso. Só queria dar um exemplo de intimidade chula para dar continuidade ao que vou contar a seguir.

Na noite passada tive um sonho curioso. Nele, eu estava dentro de uma igreja, participando de um casamento. Mais que isso, era o noivo. E a noiva, ai de mim, não era a Dani. Quando olhei para o lado e vi o rosto debaixo do véu, mal pude acreditar. Tratava-se da Débora Nascimento, a Tessália de Avenida Brasil. Devo estar vendo propaganda de chinelos demais para levar essa mulher para o subconsciente. Ela estava ali, aquele monte de estrogênio, cabelos cacheados e olhos verdes, vestida de noiva, fazendo zóinho pra mim e piscando freneticamente, como toda mulher diante do altar no dia de seu enlace matrimonial.
É, gurizada, mas cavalo de borracho sabe onde o bolicho dá sombra. E meu cérebro, que de bobo não tem nada, tratou de colocar a Dani na parada. Essa minha esposa é tão danada, que até nos meus sonhos ela entra pra marcar o território. Na primeira fila dos bancos, ali estava a minha senhora de máquina fotográfica em punho. Tirava fotos a todo momento, cada piscada da Tessália era um flash.
Aquilo, senhores, mexeu comigo. Fiquei desconfortável com a situação e parei de prestar a atenção nas palavras do padre. Já corri tanto atrás da Dani, foi tão difícil reconquistar essa mulher, que nem em sonho pude admitir casar com outra (ok, Cláudio, pode cornetear aqui). Ela, no entanto, permanecia impassível e dê-lhe fotos, enquanto fui ludibriado pela falácia do sacerdote e, quando vi, já havia dito o sim. Casei com a Tessália.
Fiquei consternado. "Seu padre, mas eu já sou casado! Minha esposa é aquela ali de câmera na mão!", eu queria dizer. Mas a noiva não me largava, era o tempo todo de braço dado comigo, onde eu ia ela estava do lado. Saímos da igreja para iniciar o deslocamento para a festa. A Dani seguiu tirando fotos. Parecia não sentir um pingo de indignação diante daquela cena, pelo contrário! Comecei a ficar triste, desanimado, queria voltar para os braços de minha amada e sair do lado daquela estranha global.
Mas, como explicar a situação para a Dani se a outra criatura não me dava espaço? Seguimos caminhando fora da igreja e chegamos num terreno baldio embarrado com terra vermelha. O que isso significa? Nada. Foi só para dar um tom descritivo mesmo. A angústia era tentar conversar com ela, parar com aquela sessão fotográfica e explicar que tudo não passava de um devaneio, que não lembrava nem de ter aceitado o casamento! Não foi possível.
Entramos na festa. Era uma sala fechada contendo uma lareira e uma televisão velha, daquelas com imagens em preto e branco. Havia umas cinquenta pessoas no recinto, sendo quarenta e cinco da família da Tessália. As outras cinco eram eu, a Dani com sua inseparável câmera e três mulheres que eu não vejo há muitos anos. Sequer são minhas amigas no Facebook. Fico me perguntando por que cargas d'água essas figuras aparecem no sonho da gente só para encher linguiça. Estavam ali, sentadas, apreciando o discurso da noiva que falava sem parar.
De repente, chegou a minha vez de falar. Era a hora do meu discurso. Logo eu, sempre afeito às vezes de orador em público, que peço a palavra até em reunião de botequim, emudeci. A verdade é que queria sumir dali, que coisa isso, casar por obrigação com alguém que nem gosto, nem muçulmano eu sou! Respirei fundo, adquiri um naco de coragem e falei. Terminei o casamento, joguei o esterco no ventilador. A cada palavra que eu dizia, percebia os queixos das pessoas caindo, principalmente o da Tessália, que ficou com uma cara de xis sem maionese digna de novela das oito.
Aproveitei o ensejo e declarei meu amor à Dani. Explicitei meu sentimento verdadeiro, disse que tudo não passava um engano, joguei a câmera pela janela e tasquei um beijo pra não dar sorte ao azar. Tessália, tomada de uma ira diabólica, passou a estapear-me como se não houvesse amanhã, ao que por sorte acordei e escapei da surra que certamente levaria da família dela. Eram quarenta e cinco contra cinco, e as mulheres que não são minhas amigas no Face provavelmente não ajudariam, seria uma briga desparelha.
No frigir dos ovos, entre quebrar um copo e casar com a Débora Nascimento, tudo não passa de confidências. O certo seria guardar para mim, no máximo dividir com a Dani e fazer o agrado de contar que nem a Tessália foi páreo para a força do nosso amor. Mas, que graça? O bonito da coisa é contar o causo e ver no que dá. Foi assim que nasceu um livro, e eu também não perderia a oportunidade de levar a público um fora dado numa mulher daquele calibre. Dá um sentimento de amor próprio bonzinho de sentir.

Perdeu, playboy!

6 comentários:

  1. Bruxo, depois de todo aquele esforço (barraca alagada, colchão esvaziando a todo momento, porre na beira da praia, etc) era só o que me faltava tu admitir que gostaria de casar com outra. hehehehhe
    Dei muita risada com esse texto. Fiquei imaginando a cara da Tessália quando tu deu o fora nela, os convidados correndo atrás de ti...
    Ótimo texto, como sempre, meu irmão.

    Abraço!

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  2. Estava indo tudo muito bem obrigada,até que: "Sim, a cozinha é pequena. Eram duas da manhã. E eu estava nu."
    Antônio do céu, intimidade é uma porcaria mesmo né? hahahaha
    Me acabei de rir com mais esse texto. Mais essa comédia.

    E ainda bem que o amor seu pela Dani é tão forte, que até mesmo em sonho você não suporta a ideia de perdê-la! Nem mesmo pra Débora Nascimento.

    Bom final de semana Ton! Obrigada por todo o carinho depositado lá no Pratododia! ;)

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  3. Pode ter certeza que rir muito com o seu texto. Já tinha percebido que os seus textos são bem íntimos, rsss... Que sonho foi este? O importante que até no seu sonho, o seu amor pela Dani é declarado e verdadeiro. Parabéns pelo texto. Beijos e um ótimo fim de semana.

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  4. Riso pouco é bobagem. Menino do céu! Até em sonhos tu declara teu amor pela Dani!! E teu humor presente em cada uma das linhas é mais que demais, como sempre.


    PS: adorei a foto da Tessália chorando. Que desfecho pra esse texto.


    Beijo amigo

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  5. Passando para agradecer a sua presença. Uma ótima semana para o casal. Beijos.

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  6. HAHAHAHAHHAHAHAHAHAHA
    intimidade é uma merda mesmo! HAHAHAHHAHAHAHAHA

    eu tenho vários textos no meu caderninho com coisas mais pessoais tive essas aí, mas nunca posto... por vergonha. mas agora tu me incentivou! prepare-se HAHAHAHAHA

    adorei teu sonho, muito amor!

    mil beijos!

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