Góstula

Inventei uma palavra nova para a Língua Portuguesa. Para me certificar de que ela realmente não existe, fui até o Google e joguei na pesquisa, ao que pude constatar que, de fato, não há nada parecido com o mais novo vocábulo criado pela minha humilde e fértil imaginação.

Chama-se "góstula".

Nasceu de maneira inusitada, enquanto ensaiava uma canção de Lupicínio Rodrigues com o coral. Com a concentração num modus operandi situado abaixo da linha da miséria, comecei a perceber que, em determinado momento da música, três sílabas formavam uma aglomeração que, com certo esforço e uma baita vista grossa de cunho gramático, poderia transformar-se em palavra.

"Felicidade foi-se embora e a saudade no meu peito ainda mora,
e é por isso que eu GOSTO LÁ de fora (...)"

Acontece que, da maneira como estávamos ensaiando, a primeira sílaba ganhou uma ênfase inusitada, dando margem para o surgimento de uma proparoxítona. Bastou repetir o verso uma dezena de vezes para o "gosto lá" virar "góstula", ao que virei para o Marquinhos e sentenciei:

- Cara, isso é uma nova palavra!

- O quê?

- Góstula!

- É verdade. Gostei! - percebeu rápido o meu amigo blogueiro-escritor-dançarino-tradutor-intérprete que, como sempre, exerce uma sintonia fina com meus pensamentos.

Ratificou-se, naquele momento, a criação deste que vem para ser um vocábulo do novo milênio. Nunca pensei, mesmo em meus maiores devaneios, que teria capacidade - e atrevimento - suficiente para inventar uma palavra em nossa tão farta língua materna. Logo ela, a Língua Portuguesa, última flor do Lácio, tão protuberante em termos de detalhes, vírgulas, acentuação, crase e regras que não cabem em anos de vida escolar e acadêmica. São milhares de vocábulos catalogados, sendo que a esmagadora maioria deles nós nem conhecemos, ou pelo menos não sabemos o significado, e eu, formiguinha inoperante nesse Brasilzão véio de Deus, subo no palanque, estufo o peito, gargarejo saliva na moela e profiro:

- Góstulaaaaaaaaa!

Me senti o próprio William Wallace. Ou, brasileiramente falando, um Dom Pedro I (até que o tamanho dos nomes se assemelha). No entanto, não posso sair dizendo góstula pra lá, góstula pra cá, sem antes definir o significado da palavra. Ora, se quero que um cidadão abra um dicionário e procure na letra G a minha tão simplória palavrinha, antes preciso dar-lhe uma razão de existir,
não dá pra simplesmente definir como "aglomeração de sílabas oportunamente identificada na canção Felicidade, de Lupicínio Rodrigues, por um lunático gaudério que não tinha mais o que fazer".
Portanto, começa aqui, nesse parágrafo, exatamente nessa linha, a busca incessante para a melhor colocação de góstula dentro da Língua Portuguesa.
Primeiramente, pensei num povo desses que faz parte dos livros de História. Alguma tribo guerreira, seja de aborígenes ou de vikings, mas que tenha lutado por um pedaço de terra alguns anos antes de Cristo e, de preferência, que tenha derrotado os Assírios, aqueles fascínoras que transformaram minhas aulas de Estudos Sociais em verdadeiras chacinas sanguinolentas, tamanho o número de povos nos quais cravaram suas impiedosas armas e degolaram criancinhas inocentes. "O domínio dos Assírios durou até a invasão de seu território pelos Góstulas que, dotados de conhecimentos estratégicos de guerras e armamentos, derrotaram-nos facilmente, tornando-se o povo que unificou o que hoje é Europa, Ásia e África por, aproximadamente, quatrocentos anos". Adoraria responder isso numa prova da professora Schirley.
Ainda no campo telúrico da História, góstula poderia ser um adorno, um enfeite pomposo dos castelos antigos, ou mesmo um cargo parecido com o senhor feudal. Peça rara de museu, a góstula valeria hoje milhões de dólares, e só possuiria uma góstula dentro de casa um amante ferrenho da arte e disposto a pagar a bagatela pedida pelos antiquários. Ou, quem sabe, ser um góstula significasse comandar o comércio do trabalho escravo dentro dos feudos, sendo uma pessoa de extrema confiança do senhor feudal e, consequentemente, de suma importância na sociedade escravocrata.
Um termo da medicina, talvez. "O senhor tem uma góstula de grau três no pulmão, o que lhe dá aproximadamente 30% de chance de sobreviver". Descobrir a cura da góstula deveria valer o Nobel de Medicina! Sendo mais humilde, também há como ser uma medida para se tomar remédio. O doutor receitaria amoxicilina e diria para tomar duas góstulas após as refeições. "Novo Gelol: agora em góstulas"!
Comida, que tal? Góstulas de cordeiro ao molho funghi. Que delícia. Só de pensar na Ana Maria Braga ensinando uma receita barbadinha para as donas-de-casa que gostariam de requintar sua ceia de Natal com um prato barato, porém sofisticado, à base de nozes e góstulas. Até tempero já me serviria! Sal, pimenta, orégano e góstula a gosto. Cheguei a salivar.
E as idéias borbulham (como góstulas, que podem perfeitamente borbulhar)! Que tal ir até uma loja comprar uma góstula para combinar com sua calça nova? Esses casaquinhos cada vez mais curtos e estranhos que as mulheres usam são tão fashion, que usar uma góstula sobre os ombros cairia como uma luva!
Perfume com aroma de góstula, uma bela flor azulada que só existe nos confins da Amazônia ou em São Francisco de Paula. Dar tanta risada, a ponto de ganhar góstulas no estômago. Comprar o novo Góstula, da Renault, com câmbio automático e rodas de liga leve. Beba Góstula, agora no sabor morango. Com gol de Góstula, Brasil fatura o hepta. Após a invasão da facção góstula, o clima é tenso em Bangladesh.
E, pra finalizar, como bom brasileiro, se nada der certo, góstula vai virar palavrão. Filho duma góstula, góstula que pariu, vá à góstula, você não passa de um góstula miséravel, Vossa Excelência está faltando com o decoro e agindo feito um góstula. Góstula é a mãe! Góstulas Safadas, o novo filme da Brasileirinhas.

É o que se pode perfeitamente classificar como criatividade inútil. A bem da verdade, inventar uma palavra significa precisar definir algo que não existe, um processo inacabado, confuso, que necessita de maneira latente de um rumo. Deve-se, provavelmente, a este momento de profunda efusão para tocar a vida, mas totalmente carente de um norte, um sinalizador de o que fazer e para onde ir. Sou, afinal de contas, o próprio góstula.

6 comentários:

  1. Depois de me recuperar das muitas risadas, tentei formular um comentário criativo, mas percebi que o que melhor cabe nesse contexto é o extraordinário: QUE MOMENTO!
    Não posso deixar de concordar contigo que responder aquilo em uma prova da Schirley seria o máximo. Mas as góstulas de cordeiro ao molho funghi me abriram o apetite! hehehe
    Uma palavra nova, que com certeza será bem vinda no meu vocaburário. Adorei!
    Escreve mais vezes, Antônio! Adoro ler os teus textos.
    Beijos!

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  2. kkkkkkkkkkkkkkk
    criatividade inusitada, inutil nunca! hehehe

    eu, góstula é muuuito dos seus escritos!!!

    beijo

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  3. Ótimo! Muito bom! Esplêndido! Gostulicamente perfeito!

    Sério, ri demais. Achei que tu não poderia me surpreender depois da parte em que eu faço uma aparição na historinha, mas as definições gostúlicas que tu teceu foram demais.

    Esse foi dez, digno de ir pra concurso ou algo assim.

    Um abraço!

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  4. Olá amigo

    Show de bola esse teu blog heim.
    parabéns.


    www.erexim.blogspot.com

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  5. kkkkkkkkkkkkkk
    adorei!
    pouca criatividade, hein?
    e concordo com Marquinhos que merecia participar de um concurso!

    um bjoooo gostularmente (?!) estalado pra vc!!!!

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  6. Ton! Dá um Update e põe aqui teu vídeo ♥

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